ANÁLISE JURÍDICA DO FILME “PATERNIDADE”

Iniciemos o mês de homenagem aos Pais com a análise jurídica do filme “Paternidade”, disponível na plataforma Netflix, baseado nas memórias de Matthew Logelin, que tem Kevin Hart como protagonista e direção de Paul Weitz.

Historicamente, o Dia dos Pais se originou nos Estados Unidos, em 1910 quando Sonora Louise SmartDodd, filha de um veterano de guerra, ouviu um sermão de homenagem às mães e teve a ideia de homenagear os pais também, mas foi apenas em 1966 que o presidente Lyndon Johnson aprovou a data.

No Brasil, todo segundo domingo de agosto é dedicado para esse dia. A data surgiu com o publicitário Sylvio Bhering e coincidentemente foi comemorada pela primeira vez no Brasil no dia 14 de agosto, dia de São Joaquim, santo que é considerado o patriarca da família. Após isso, a comemoração se tornou tradição.

Assim, paternidade é um conceito que vem do latim “paternitas” e que diz respeito a condição de ser pai. Significa que um homem se tornou pai de alguém. Segundo o dicionário Aurélio: Estado, qualidade de pai. Relação jurídica entre pais e filhos. No sentido figurado: Criação, autoria.

De um modo geral, usa-se a palavra paternidade para designar a qualidade do pai (homem). No caso da mulher, a noção associada a ser mãe é maternidade.

Nesse contexto, o filme em análise, intitulado “Paternidade” é inspirado na história real de um pai viúvo que lida com dúvidas, medos, decepções e mamadeiras ao assumir a tarefa de criar sua filha sozinho.

Trata-se de uma delicada história sobre um pai solteiro lutando para criar sua filha em um mundo difícil e cheio de complicações, mas que consegue atravessar esses momentos com muito amor. É um filme profundamente humano, dirigido com delicadeza e com atuações acima da média.

A história de Paternidade começa com Matt, um trabalhador que se mudou para Boston e se tornou pai solteiro depois que sua mulher, Liz, morre um dia depois do parto[1] da filha do casal, Maddy.

Ele decide, então, criar a menina como “pai solo”, mesmo que ninguém acredite que ele tenha vocação para isso (ninguém mesmo, como o filme deixa claro inúmeras vezes).

A expressão mãe solo[2] é mais conhecida do que pai solo, porém, ambas dizem respeito a um único genitor que se torna responsável financeiramente pela criança, dá amor, carinho, proteção e tem a força para fazer tudo isso sem a presença do outro genitor.

Além disso, a paternidade ou maternidade é para sempre, diferente do estado civil, que não tem nada a ver com isso.

Mas, mesmo com a tristeza de perder sua esposa, que também era sua namorada desde a época do ensino médio, no filme, Matt faz um juramento para fornecer apoio completo à filha e assumir todas as responsabilidades que cabem a um pai.

Percebe-se claramente que o ator principal não quer ser apenas um “pai de papel[3], ele quer estar presente e acompanhar todas as etapas do desenvolvimento de sua filha, cumprindo com todos os direitos[4] e obrigações da paternidade responsável, mesmo que isso lhe custe enfrentar inúmeros desafios.

Assim, ao voltar para o trabalho, seu chefe o aconselha a tirar um tempo de licença, que ele usa para aprender a criar a menina, para dar banho, fazer mamadeira, ninar, e isso inclui temas como trocar fraldas cheias de fezes, náuseas, carrinhos dobráveis, noites sem dormir, cantar com os amigos para fazê-la dormir, inventar um novo penteado, e ainda o fato de que não há pessoas com quem falar sobre.

Ele conta com a ajuda de sua sogra, que insiste em ficar para ajudá-lo, e também de sua própria mãe, mas em menor grau, o que demonstra claramente a importância da convivência familiar, principalmente em períodos de luto em família como é o caso do filme.

Os avós são figuras presentes na trama, o que demonstra claramente o quanto a convivência entre avós e netos[5] tende a fazer bem à saúde de todos os envolvidos. Por isso, é algo que reflete no desenvolvimento psicológico, social e cultural da criança, além de trazer renovação da vida dos avós.

Até podemos dizer que a convivência familiar é legal em todos os sentidos. Tanto por fazer bem aos avós e aos netos como também por ser garantida por nossa legislação.

Juridicamente falando, a Constituição Federal (artigo 227), o Estatuto da Criança e do Adolescente (lei 8069/90), além do Código Civil (artigo 1.589), resguardam o direito dos avós e da criança à convivência familiar. No entanto, essa convivência deve privilegiar o bem-estar e o melhor interesse do menor sempre.

Acontece que no filme, Matt quer fazer tudo sozinho, e da forma como ele e sua falecida esposa Liz imaginaram para a criança, tentando dar a Maddy a criação que ela pretendia, o que acaba se revelando um grande desafio para um homem que, até então, não tinha qualquer experiência sobre como criar uma criança.

Paternidade é um filme que apela para as emoções do público com muita facilidade. Dividido em dois momentos diferentes, o primeiro acompanha os desafios de Matt com sua filha recém-nascida e depois com a menina aos 05 (cinco) anos, indo para o jardim de infância[6].

Os acontecimentos são rápidos, apostando em um ritmo corrido, mas nada que prejudique o desenrolar da trama. Sua relação de pai e filha gera uma identificação bem-vinda para todos que assistem.

O filme Paternidade não mostra de perto cenas românticas, por exemplo, apesar de não deixar palavrões de lado. Quando as pessoas em volta de Matt perguntam onde está a mãe da criança e ele inventa divertidas desculpas. Quando o chefe oferece semanas de folga, permite que ele leve a criança para uma reunião de trabalho, ameaça demiti-lo e depois oferece uma promoção.

Alguns acontecimentos não soam como um reflexo real dos desafios de um pai solteiro negro nos Estados Unidos. É utópico, mas em Paternidade funciona.

 Provavelmente aqui no Brasil, os desafios da paternidade vivida por Matt poderiam ser ainda maiores face ao preconceito e a discriminação arraigada na sociedade.

A única crítica construtiva que o filme ousa fazer é sobre a questão de gênero e o vestuário ainda imposto para meninos e meninas na escola e na sociedade atual, por exemplo, na qual podemos associar ao bullying que Maddy poderia ter sofrido nesse ambiente escolar.

Apesar de não retratar no filme, fazendo um comparativo, nos termos da Lei nº 13.185, de 6 de novembro de 2015, que em seu artigo 5º afirma que é dever do estabelecimento de ensino, assegurar medidas de conscientização, prevenção, diagnose e combate à violência e à intimidação sistemática (bullying)[7].

Outrossim, Paternidade também revela uma jornada que explora a emoção e levanta questionamentos que tocam lá no fundo do coração, quando Matt precisa dar uma chance para si mesmo e superar seu luto de anos, permitindo-se dar uma chance para um novo relacionamento, namoro e novos arranjos familiares que podem surgir em virtude disso.

Por outro lado, o filme aborda a paternidade de Matt e sua filha biológica Maddy, porém, a Paternidade hoje é vista como um gênero, na qual são espécies a paternidade biológica e a paternidade socioafetiva[8], ambas produzindo efeitos jurídicos patrimoniais e extrapatrimoniais, tais como: dever de prestação alimentar, direito de guarda, dever de educação, direitos sucessórios, previdenciários, dentre outros.

A Constituição Federal de 1988, que consagrou o “Princípio da Dignidade da Pessoa Humana” e o “Princípio da Proteção Integral da Criança e do Adolescente”, acrescentou a afetividade a fim de definir as relações familiares.

Em decorrência, pelos laços de afeto, convivência familiar e posse do estado de filhos, foi definida a paternidade socioafetiva. Na paternidade socioafetiva não há vínculo sanguíneo ou por adoção, trata-se do reconhecimento afetivo e do trato social como se fossem pai e filho.

Já a paternidade biológica é a decorrente de laços consanguíneos. Pai biológico é aquele que gerou a criança, podendo ter ou não algum vínculo e/ou convivência com a criança.

Desse modo, o princípio da paternidade responsável impõe que, tanto o pai biológico quanto o afetivo devem ser acolhidos pela legislação, vigorando o vínculo socioafetivo e biológico em grau de igualdade na hierarquia jurídica.

Ainda relacionado ao tema, importante ressaltar que a investigação de paternidade[9] no ordenamento jurídico brasileiro fundamenta-se na Lei nº 8.560/92, no artigo 1.606 do Código Civil e no artigo 27 da Lei n.º 8.069/90 – ECA, considerando a hipótese de uma criança ou adolescente não ter sido registrado com o nome paterno, tendo apenas o nome da mãe em sua certidão de nascimento.

Desse modo, quando uma criança é registrada somente pela mãe (pelo fato do pai ser desconhecido; por existência de dúvidas sobre quem pode ser o pai; o suposto pai falecer antes do nascimento da criança; não ser casado com a mãe, dentre outros), o cartório do registro de nascimento deverá informar essa situação ao Ministério Público, que tentará entrar em contato com a genitora e com o suposto pai, a fim de que se tente o reconhecimento da paternidade de forma mais rápida e amigável.

Caso o genitor não seja encontrado ou se negue a reconhecer a paternidade sem a necessidade de um processo, o caminho será, então, pelo ingresso de uma ação judicial, que poderá ser iniciada a qualquer momento, pois não está sujeita a prazo decadencial. Além do mais, o direito ao vínculo de filiação é indisponível, ou seja, ninguém pode “abrir mão” dele.

Feitas tais considerações, em suma, sabemos as inúmeras mudanças que a chegada de um filho representa na vida de uma mulher e de um homem.

Ocorre que infelizmente muitos pais não participam ativamente no dia a dia dos filhos no que tange as atividades domesticas, necessidades básicas como bem-estar físico, higiene corporal, atividades lúdicas, alimentares, escolares e etc.

Ser pai de verdade não é só brincar com os filhos, “jogando” todas as outras atividades e responsabilidades nas costas da mãe por exemplo, mas sim estar presente a qualquer hora para o que der e vier, é acordar de madrugada para acalmar e tranquilizar o filho que acordara assustado, fazendo com se sintam protegidos, é fazer o lanchinho da escola, mamadeira, dar banho, trocar fralda e participar em uma infinidade de momentos em que seu filho não pode ou ainda não consegue fazer sozinho, é ter uma participação ativa na constituição emocional da criança.

A palavra “pai” é sinônimo de herói[10] e do exemplo a ser seguido pelos filhos. Geralmente é através de seu pai que você recebe os valores familiares que te guiam ao longo de toda a sua vida e que serão fundamentais para que você sempre saiba qual caminho trilhar.

Portanto, o filme Paternidade tem cunho de alerta para os homens, é como se estivesse falando para cada um deles que se casou e pretende ter filhos, que é necessário aprender mais sobre educação infantil e estarem preparados e atentos, principalmente se ficarem sem a mãe para cuidar de seus bebês.

O aviso é claro, é bom ficar esperto e aprender enquanto espera a chegada do pequeno ou da pequena, ao menos fazendo isso, não vão passar pelas dificuldades que Matt teve que enfrentar por não ter se informado antes.

O filme é carregado de fortes emoções, mesmo não tendo nada de novo para mostrar, o elenco consegue aproximar o público a vários fatos vividos na vida real de um pai ou de uma mãe solteiros.

Sendo assim, quem ainda não assistiu, se prepare para rir, mas também para se emocionar A história sobre o amor de pai e filha, baseada em fatos reais promete ser muito emocionante e divertida ao mesmo tempo.

Por Talita Verônica

Capa: Apostila de cinema

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