“Você Não Manda em Mim”

Sabe que eu até concordo em parte com esse pensamento e com essa fala do seu filho, embora não seja justificativa para que ele fale dessa forma com você e muito menos que você permita que ele fale dessa forma, colocando limites para ele de forma firme e gentil.

No entanto, eu de fato, penso que não mandamos em ninguém, muito menos nas crianças.

Crianças são seres humanos como nós. Tem vontades, desejos e opiniões.

Tem temperamento, personalidade própria que está sendo formada, assim como também a identidade. Estão construindo sua visão de mundo, sua visão sobre os outros e sobre eles próprios.

Não possuem ainda condições de decidirem sobre várias situações, mas já possuem opiniões e vontades, portanto, quando falam que não mandamos neles, de fato, em parte eles tem razão.

Vamos entender um pouco melhor sobre isso e aprender algumas estratégias que podemos usar com nossas crianças e que com toda certeza, trará muito mais colaboração e aprendizado de habilidades importantes para a vida?

O Exemplo Vale Mais do Que Mil Palavras

Quando as crianças são bebês, temos uma tendência a acreditar que eles não entendem nada, não sabem de nada e que temos que decidir tudo por eles e eles tem que aceitar.

No entanto, se olharmos atentamente para um bebê desde a barriga da mãe e da maternidade, já começamos a perceber muita coisa.

 Já podemos perceber que tem aqueles bebês que na barriga da mãe são mais agitados ou aqueles que são mais tranquilos. Quando nascem, desde o bercinho lá na maternidade, já começam a mostrar um pouquinho do seu temperamento.

 Já começam a chorar mais ou menos, se agitar mais ou menos no berço, precisam mais da atenção e do colo dos adultos e isso tudo, é o início do temperamento que começa a se manifestar.

Sabemos também que desde o útero, já começam a construir memórias e também a desenvolver conexão e afeto com a mãe e com o pai. Temos diversos estudos que hoje nos comprovam que desde a gestação a criança já sente o afeto, o estresse e até mesmo tudo que é sentido e vivido pela mãe.

Quando começam a crescer e a se tornarem independentes, elas começam a demonstrar mais ainda muito do seu temperamento e até mesmo da personalidade que começa a se formar.

Podemos perceber aquela criança que é mais líder ou então mais passiva, aquela criança mais sensível ou aquela que parece sentir muito menos tudo que lhe acontece, aquela que é curiosa, divertida ou até mesmo mais brava e zangada, se irritando com mais facilidade.

As vontades e desejos da criança começam a se formar e a aparecer e a partir daí, começam os conflitos.

Os pais querem que a criança coma, vista, tome banho, escove os dentes e muitas outras tarefas do dia-a-dia e a criança se nega a fazer, muitas vezes não tendo o mesmo desejo dos pais e querendo fazer o que querem, até porque, crianças querem fazer o que lhes dá prazer.

E convenhamos que até nós que somos adultos, muitas vezes, temos uma certa preguicinha de fazer as atividades, não é?

Imaginem então, as crianças que são literalmente movidas pelo prazer e pelo o que é mais divertido e possuem o controle inibitório (região do cérebro que regula nossos impulsos), ainda imaturo, apresentando dificuldades para adiar recompensas.

Compreendendo tudo isso, começamos a entender o porquê é tão difícil quando mandamos as nossas crianças fazerem algo.

Quero fazer um exercício rápido com vocês:

– Fechem os olhos e imaginem em sua mente duas situações:

– Na primeira delas eu peço que imaginem o chefe de vocês ao lado de vocês, mandando da seguinte forma: “Termine esse relatório já porque eu estou mandando!”;

– Na segunda situação eu peço que imaginem novamente o chefe de vocês, falando com vocês da seguinte forma: “Precisamos terminar o relatório para amanhã, como podemos organizar para que você consiga finalizar hoje?”

Agora que imaginou as duas situações, me diga em qual das duas, você sentiu mais vontade de fazer a tarefa solicitada pelo seu chefe.

Eu aposto que deve ter sido na segunda situação não é mesmo?

Sabe por que isso acontece?

Quando mandamos ou damos alguma ordem a alguém, já ativamos uma reação de defesa no cérebro da pessoa, pois provocamos uma certa “revoltazinha”, afinal de contas pensamos quando somos mandados:

“Não estou conseguindo exercer minha vontade e ninguém manda o que tenho que fazer” (aposto que é assim que você pensa, não é?) e nesse momento, ativamos a nossa região mais primitiva do cérebro, que nos faz entrar em reação de luta ou fuga, ou seja, ou eu não quero fazer ou quero procrastinar e fazer do meu jeito.

A partir daí, entro em conflito com a pessoa, porque o que vale é o que eu quero, preciso ganhar a qualquer custo e quando falamos da criança, somado a isso, por vezes, temos sono, fome, necessidades básicas, incapacidade de regular e organizar as emoções e expressá-las.

Além de termos também, como já mencionado acima, a região que regula nossos impulsos imatura.

Portanto, compreendendo tudo isso, compreendemos o porquê quando mandamos nossas crianças fazerem determinadas coisas ou damos algumas ordens, eles resistem, lentificam ou até mesmo começam uma disputa de poder sobre fazer a tarefa solicitada.

No entanto, quando perguntamos, estamos movimentando o cérebro das nossas crianças para que encontrem uma solução junto com a gente para aquilo que precisam fazer, além de fazerem com que se sintam poderosos, afinal de contas, o poder de realizar está nas mãos delas.

Você sabe dizer NÃO para o seu filho?

Muito embora seja você, adulto, quem está no controle da situação, a criança tem uma falsa impressão de que na verdade, ela é quem está decidindo o que fazer.

Além disso, crianças são naturalmente altruístas e querem como todos os seres humanos se sentir importantes, portanto, irão colaborar mais facilmente.

Vamos ver algumas dicas de perguntas que podemos usar com nossas crianças para substituirmos as ordens?

– Como você quer ir até o banheiro para tomar seu banho? Pulando de um pé só ou voando como um avião?;

– O que fazemos após o jantar?;

– O que fazemos após usar o banheiro?

– Está frio lá fora. Você quer usar o casaco azul ou verde?;

– De que forma nós organizamos a rotina antes de ir para a cama?;

– O que fazemos antes de dormir?;

– O que você precisa fazer para desligar a TV às 20 horas?;

– O que você precisa fazer para terminar sua tarefa?;

– Qual horário que podemos ver TV?;

– Como podemos nos organizar para sair para o lanche?;

– Percebo que você está muito zangado agora. Quando você se acalmar, podemos pensar em uma solução para consertar seu brinquedo juntos, está bem?;

– O que nós viemos comprar no supermercado? Lembra qual era nosso combinado? Quantas coisas você podia escolher hoje?

E então, perceberam a diferença? Se até nós adultos temos a vontade de ajudar a encontrar uma solução, imaginem as crianças.

Desafio vocês a começarem a praticar por aí e depois virem aqui nos comentários ou mesmo em nossas redes sociais nos dizer como está sendo com seus filhos. Lógico que para lidar com birras e desafios, muitas outras coisas estão envolvidas como já tenho trabalhado em todos os meus outros textos.

Mas usar o cérebro social, colaborativo e altamente capaz de resolver problemas do seu filho, com certeza, irá lhe ajudar muito, além de ensinar a ele habilidades de vida e habilidades sociais, muito diferente da revolta e da passividade que um comportamento de autoridade como o mandar, pode causar.

Qual deles você prefere escolher? Agora a escolha está em suas mãos como adulto. Topa começar?

Só lembrando que adultos que desenvolvem essas capacidades desde pequenos, são muito mais propensos a desenvolver comportamentos de colaboração e altruísmo na vida adulta.

O que você espera do seu filho?

Vamos juntos mudar essa história?

Por Renata Lela

Capa: FreePik

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