Hoje iremos conversar sobre a relação da criança com surdez, família e escola.
Para entender a importância dessa parceria é preciso fazer um relato a respeito de cada um desses atores.
A relação familiar torna um caráter mais especial para as crianças com deficiência.
Gronita (2008) relata que são as famílias, apesar das dificuldades emocionais, procuram encontrar, por diversos e dispersos serviços, informação sobre a deficiência do seu filho e as condições facilitadoras do desenvolvimento global da criança e otimizadoras das interações criança/família.
A família sempre foi considerada como o primeiro espaço de aprendizagem da criança, ou ainda, a primeira instituição social significativa para a formação educacional do ser humano tendo em vista que, nela ocorrem os primeiros contatos com os outros indivíduos.
Posteriormente, ao ingressarem na escola a criança entrará em contato com outros grupos e, interagindo com os demais colegas, internaliza outras regras, bem como compreenderá as novas organizações sociais.
De acordo com Braga (2016) a presença dos pais na educação é muito importante, porque as crianças precisam estabelecer com seus pais, professores e outros adultos, relações de confiança e ajuda.
A Declaração de Salamanca (1994) exorta a importância da família dizendo:
Os pais são os principais associados no tocante às necessidades educativas especiais de seus filhos, e a eles deveria competir, na medida do possível, a escolha do tipo de educação que desejam que seja dada a seus filhos.
Por esta razão, cabe à família a escolha da educação de seus filhos e isso implica em selecionar a instituição que utiliza a melhor abordagem educacional voltada à pessoa surda e acompanhar esta proposta. Lembremos o que diz a Constituição Federal (BRASIL, 1988):
A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.
Sobre a construção destas relações de confiança entre a escola e a família, Vieira e colaboradores (2011) destacam:
Ainda que a participação da comunidade é um processo que necessita ser construído aos poucos e precisa também de mecanismos institucionais para dar suporte à boa vontade dos profissionais que acreditam na sua implementação.
Ao pensar o aluno com surdez existem algumas especificidades devido as barreiras comunicacionais.
A surdez é uma perda de percepção dos sons e da palavra falada em decibéis (dB).
Pode ser classificada com referência às Normas ISO em ligeira, moderada, severa, profunda ou total; ou, ainda, a surdez infantil pode se classificar em clinicamente isolada, sindrómica, congénita, adquirida e genética, e quanto ao momento de aparecimento da surdez, antes ou após o aprendizado da fala.
Sabemos que a linguagem é fator importante para o desenvolvimento infantil.
Segundo as pesquisas de Narigão (2019,), há, na literatura, evidências de que crianças surdas filhas de pais ouvintes têm efeitos prejudiciais no desenvolvimento.
As suas pesquisas apontam que crianças surdas estão em risco de desenvolver atrasos significativos no desenvolvimento da linguagem, das competências metacognitivas, da capacidade de regulação e reconhecimento emocional e da capacidade de pensamento consequencial.
Contudo, por outro lado, segundo pesquisas apontadas por Narigão (2019):
As crianças surdas com pais surdos apresentam um melhor desempenho social e acadêmico do que as crianças surdas com pais ouvintes, alcançando os mesmos marcos desenvolvimentistas que as crianças ouvintes.
Esse fato demonstra que não é a surdez em si que causa as dificuldades experienciadas por muitas crianças surdas, mas a forma como se lida com a surdez, já que há aceitação por parte dos pais surdos da surdez da sua criança e consequente eficácia da comunicação precoce.
Assim, os autores são unânimes na necessidade da detecção da deficiência auditiva e da estimulação integral para melhor aproveitamento no desenvolvimento dessas crianças.
Dessa maneira, Vieira e seus colaboradores (2012, p.83) alertam:
A linguagem se traduz como um elemento essencial no desenvolvimento infantil, pois é fundamental para a recepção e estruturação das informações, a organização perceptual, a aprendizagem e as relações sociais; portanto, há necessidade do diagnóstico da deficiência auditiva (DA) o mais precoce possível.
Um ponto a ser pensado nessa população é a língua.
A Língua é um sistema padronizado de sinais/ sons, arbitrários, caracterizados pela sua estrutura dependente.
É o meio que exprimimos nossas emoções, verbalizamos o que sentimos, nos auxilia a coordenar trabalho e experiências com os outros, a proporcionar orientações na busca da realização de atividades e a compartilhar representações de mundo presentes, distantes ou imaginárias, faz parte da constituição de nossa identidade.
A língua exerce um papel fundamental na nossa vida e na nossa formação como sujeitos.
Pais e professores precisam ter esse olhar para nossos alunos promovendo espaços de diálogo, nos quais os alunos tenham voz e possam escutar as diversas opiniões e, nessa interação, crescer enquanto sujeitos.
Nós, somos seres que sempre necessitamos do contato com o outro, somos seres sociais.
Em especial no processo de Alfabetização
Vygotsky falava que é na interação com o outro que a pessoa internaliza conceitos e conhecimentos.
Quando pensamos em língua sempre imaginamos as línguas orais, aquelas que são faladas, como o Inglês ou o Francês.
No entanto, existem as línguas que são produzidas a partir de sinais, essas possuem uma estrutura própria. Seus principais usuários são aqueles que possuem perdas severas de audição.
A Língua de Sinais é compreendida pelos órgãos da visão que é a forma como os Surdos compreendem o mundo.
Atualmente, a Língua de Sinais é uma língua reconhecida e considerada um Direito Linguístico da Pessoa Surda, é a língua mais utilizada por eles.
No entanto, nem sempre foi assim, foram longos anos de luta em todo o mundo.
No Brasil, a educação de surdos iniciou na época Dom Pedro II, que construiu o Instituto de Educação para Surdos e convidou Huert para ensinar a Língua Francesa de Sinais aos Surdos Brasileiros.
Esse ensino deu origem ao uso de sinais na comunicação e instrução dos alunos surdos.
Durante o II Congresso de Milão o oralismo, ensino da fala e leitura labial, foi adotado como método de ensino para os surdos e a Língua de Sinais proibida na instrução do sujeito surda.
Essa medida não trouxe bons reflexos, os Surdos saiam das escolas com pouco conhecimento e aqueles que não se adaptaram ao oralismo eram tidos como pessoas de baixíssimo QI.
A aprovação de leis no Brasil como a lei nº 10.436/04.2002 que reconheceu a LIBRAS, Língua Brasileira de Sinais, Direito Linguístico da Pessoa Surda e o decreto nº 5.626/12.2005:
Permitiu à surda inserção no mercado de trabalho, bem como também a regulamentação e formação de professores e instrutores da língua de sinais, traz com propriedade e com clareza um período histórico novo para a comunidade surda;
Esse é um grande avanço para a comunidade surda e um alicerce para se efetivar a parceria entre escola e família na construção do sujeito surdo.
Por Caroline Nunes
Capa: FreePik
Referencias:
BRAGA, Ana Regina Caminha. A importância da família na educação infantil. 2016. Disponível em: Acesso em: 20 jun. 2017. BRASIL. Constituição Federal de 1988. Promulgada em 5 de outubro de 1988. Disponível em: Acesso em: 20 jul. 2017.