Ser Mãe é ter um Coração que Se Estende

Ser mãe é mais do que um papel — é um movimento da alma. É uma entrega que não se limita ao sangue, ao corpo ou ao nome que consta nos documentos. Ser mãe é, antes de tudo, um ato de presença. É um lugar de escuta, de acolhimento, de firmeza e de ternura.

A psicologia nos ensina que a função materna vai além da figura da mulher que dá à luz.

Donald Winnicott, psicanalista inglês, nos presenteou com a ideia de “mãe suficientemente boa” — aquela que, ao invés de buscar a perfeição, oferece o necessário: um espaço seguro para o crescimento do outro. Não importa se essa mãe tem o nome de professora, avó, madrasta, pai ou tia; importa que ela esteja ali, suficientemente presente para sustentar o processo de amadurecimento de alguém.

Há mães que se tornam mães no parto. Outras, no encontro. Há aquelas que se descobrem mães ao embalar um filho que não saiu de seu ventre, mas habita seus braços com a mesma intensidade. Adoção é também parto — é parir com o coração. Como diz Carl Gustav Jung, “onde o amor impera, não há desejo de poder; e onde o poder predomina, há falta de amor.”

A maternidade verdadeira nasce no território do amor, não do controle. E, por isso, cabe em muitos formatos.

Mãe é também aquela professora que, ao perceber os olhos tristes de um aluno, se senta ao lado e pergunta com delicadeza: “O que está acontecendo com você?”

Essa atitude, simples e poderosa, ecoa o que Heinz Kohut chamou de selfobject: alguém que, ao ser empático e disponível, ajuda o outro a formar uma autoestima saudável. A função materna está nisso — no cuidado que vê além da superfície, que reconhece o outro como um ser em formação.

Há pais que são mães. Que trançam cabelos, comparecem nas reuniões escolares, aprendem a cozinhar os pratos preferidos dos filhos e sabem a hora certa de oferecer um abraço. O papel materno pode ser exercido por qualquer um que se disponha a sustentar o afeto.

Como diz Clarissa Pinkola Estés, psicóloga e poeta, “ser mãe é um trabalho de alma. Requer uma mente clara, um coração forte e um espírito paciente.”

Há avós que voltam a ser mães em tempo integral. E madrastas que, com paciência e humildade, vão costurando vínculos verdadeiros, cuidando dos filhos do outro como se fossem seus. Há irmãs mais velhas que maternam, vizinhas que acolhem, cuidadoras que se tornam parte da história afetiva de alguém.

A maternidade, então, é um manto que se estende. Não é só biologia — é biografia. Está nos gestos pequenos e nos silêncios que protegem. Está na coragem de enfrentar noites mal dormidas, mas também no discernimento de saber quando soltar a mão.

Ser mãe é também aprender a partir-se em muitos pedaços e ainda assim manter-se inteira. É viver o paradoxo de ser fortaleza e abrigo, guia e espelho. É, como nos diz a psicologia do desenvolvimento, oferecer uma “base segura” — conceito de John Bowlby — da qual o filho pode partir para o mundo, sabendo que pode sempre voltar.

Na jornada da maternidade, há alegria, mas também dor. Há medo de errar, culpa que ronda, cansaço que pesa. A maternidade não é só luz — há sombras também. E é preciso que se diga: ser mãe não é ser heroína o tempo todo. A saúde mental das mães importa. Como lembra Françoise Dolto, pediatra e psicanalista, a escuta verdadeira começa quando permitimos que a mãe seja vista também como sujeito — com desejos, limites e história própria.

Que possamos então olhar para todas as formas de maternar com mais compaixão. Que celebremos não apenas o dia das mães, mas os dias com as mães, para as mães e entre mães — de todas as formas, cores e afetos.

Ser mãe é deixar marcas invisíveis na alma de alguém. É ser abrigo, sim — mas também ser ponte. É deixar marcas invisíveis de amor na alma de alguém. É ser casa, e também estrada. É ser presença, mesmo na ausência. É ser amor que educa, que protege, que fortalece.

E no fim, talvez ser mãe seja isso: estender o coração para que outro coração aprenda a bater em paz.

Carla Povoa

 

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