AÇÚCAR NA INFÂNCIA

Os perigos do consumo excessivo de açúcar na infância

Muita gente considera natural que as crianças consumam doces e açúcar de forma rotineira.

Muitas vezes, oferecer açúcar traduz em expressão de afeto e carinho, especialmente por parentes que não convivem todos os dias com a criança.

O consumo frequente e excessivo do alimento pode prejudicar a formação dos hábitos alimentares.

Eu sempre ressalto que os primeiros anos de vida são um período crítico para o desenvolvimento de preferências por alimentos e sabores, para a capacidade de autocontrole na ingestão de alimentos, e para o risco de desenvolvimento de doenças a médio e longo prazo, como o sobrepeso e a obesidade.

Açúcar nos dentes

Cada vez mais as crianças estão sendo portadoras de doenças que até alguns anos atrás, eram exclusivas de adultos. É um cenário triste e preocupante.

Ou seja, nos primeiros anos de vida precisamos aproveitar as janelas de oportunidades para reforçar hábitos positivos de vida, enquanto a criança ainda é bastante dependente, especialmente na busca por comida.

O açúcar, ao ser ingerido, é absorvido no intestino, passa pelo fígado e segue para a corrente sanguínea.

O que for aproveitado pelo organismo será transformado em energia e o que não for utilizado, em gordura.

O consumo excessivo de açúcar, sem um gasto adequado de calorias, faz com que a criança estoque essas calorias excedentes em forma de gordura corporal, que, por sua vez, em exagero, pode gerar problemas em vários órgãos. Sem contar o aumento das placas bacterianas e cáries.

Além disso, o açúcar pode causar dependência, como muitas drogas. Especialistas em neurociência apontam que açúcar pode ser tão viciante quanto cocaína.

Além de não ter nutrientes, o açúcar ativa vias de sinalização no hipotálamo relacionadas ao centro do prazer e ao sistema de recompensas, por isso é viciante e pode estar relacionado a comportamentos compulsivos.

As guloseimas, geralmente ricas em açúcar, contêm componentes que estimulam o cérebro a produzir a serotonina, neurotransmissor responsável pela sensação de felicidade, bom humor e bem-estar.

Ou seja, quanto mais eu como, mais meu organismo pede. Em situações de tensão, ansiedade ou estresse, o desejo parece ser ainda maior.

As entidades científicas de Pediatria e Nutrição indicam que o açúcar não deve ser oferecido antes do segundo ano de vida. Se a família conseguir restringir o consumo um pouco mais, seria ainda mais interessante.

Até essa idade, os alimentos não devem ser adoçados com absolutamente nenhum açúcar.

Embora o açúcar refinado seja o mais lembrado pelas pessoas, reforço que existem muitos tipos de açúcar. Além do açúcar branco, mascavo, demerara, açúcar de coco, xarope de milho, mel, melado ou rapadura também são contraindicados.

O açúcar também está presente na maioria dos alimentos industrializados e ultraprocessados como achocolatados, bebidas açucaradas, cereais matinais, gelatina em pó com sabor, mingaus instantâneos preparados com farinhas de cereais (de arroz, milho e outros), iogurte com sabores e tipo petit suisse, guloseimas como balas, chicletes, pirulitos e chocolates, além de biscoitos e bolachas doces.

Esses alimentos citados acima geralmente têm uma identidade visual repleta de elementos que remetem ao bom crescimento e desenvolvimento na infância, o que pode induzir os pais e cuidadores a acharem que são alimentos saudáveis, mas não são.

Segundo o Guia Alimentar Para Crianças Brasileiras Menores de 2 anos[1], uma publicação do Ministério da Saúde, uma alimentação adequada e saudável começa com o aleitamento materno até os 2 anos ou mais, oferecendo somente o leite da mãe até os 6 meses, e continua com a oferta de alimentos in natura e minimamente processados, além do leite materno, a partir desse primeiro semestre.

Todos nós temos uma preferência inata pelo sabor doce desde o nascimento.

Aliás, esta predileção ajudou nossos antepassados a escolherem os alimentos, diferenciando os alimentos tóxicos dos seguros, por exemplo.

Como a criança já tem preferência pelo sabor doce desde o nascimento, se ela for acostumada com preparações adoçadas poderá ter dificuldade em aceitar verduras, legumes e outros alimentos que despertam outros sabores e sensações no paladar, como o amargo, o azedo ou até mesmo o doce natural dos alimentos in natura.

Sempre oriento as famílias que precisam driblar o consumo excessivo do açúcar, que façam uso da paciência e do amor.

Mudar hábitos não é uma tarefa fácil, ainda mais quando o alimento é saboroso e nos traz sensação de felicidade.

Uma boa maneira para reduzir o consumo do açúcar é preparando as refeições em casa.

Primeiro porque, ao cozinhar os próprios alimentos, você tem o controle daquilo que é preparado e consumido.

Segundo porque essa é uma possibilidade de envolver a criança nas preparações culinárias, apresentar diferentes cores, texturas, aromas e sabores, permitindo o despertar para uma alimentação adequada, saudável e saborosa.

Envolver a criança na escolha da refeição da família, no planejamento da alimentação e no seu preparo é uma excelente estratégia para que ela passe a apreciar mais os alimentos.  Assim, o cozinhar pode ser um grande aliado.

Outra estratégia é utilizar de alimentos naturalmente doces  para realçar esse sabor nas preparações. Algumas frutas e legumes, como a banana madura e a cenoura, podem ser ótimas fontes para isso.

Técnicas culinárias de cocção, como assar ou cozinhar também podem intensificar os sabores adoçados das frutas e legumes.

Outra estratégia importante e sempre ler os rótulos quando for oferecer algum alimento processado. Isto porque até alimentos salgados podem ter açúcar em sua composição.

O mais importante é entender que não precisamos comer açúcar. A criança muito menos.

Ficamos achando que a criança está sofrendo por não comer açúcar, mas é porque já estamos acostumados a um sabor muito doce.

A criança pode ter uma alimentação muito variada em termos de estímulos sensoriais de cores, sabores, texturas sem o sabor doce. E ainda assim se sentir muito amada e feliz!

Por Fabiana Jarussi

Capa: FreePik


[1] Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção Primaria à Saúde. Departamento de Promoção da Saúde. Guia alimentar para crianças brasileiras menores de 2 anos / Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção Primaria à Saúde, Departamento de Promoção da Saúde. – Brasília : Ministério da Saúde, 2019.

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