OS DIREITOS E OBRIGAÇÕES DOS AVÓS

Os direitos e obrigações dos avós surgem diante do aumento da perspectiva de vida que também provocou alterações na formatação das famílias.

Depois do direito à vida e saúde, talvez nada seja mais importante do que o direito à família, lugar idealizado onde é possível, a cada um, integrar sentimentos, esperanças e valores, afinal, todo ser humano pertence a uma família.

Antigamente, a feição rural da sociedade exigia força de trabalho, mas com a Revolução Industrial a família migrou para os grandes centros, passou a residir em casas menores e tornou-se nuclear, formada pelos pais e seus dependentes.

Nesse contexto, os idosos não mais podem ser desconsiderados no universo das relações familiares e os avós surgem como uma nova figura em busca de espaço afetivo.

Essa reconfiguração recebeu o nome de família extensa ou ampliada, quando existem vínculos de afinidade e afetividade de uma criança ou adolescente para com algum parente, conforme dispõe o artigo 25, parágrafo único, do Estatuto da Criança e Adolescente.

Dessa maneira, o papel dos avós na família contemporânea ultrapassa os presentes e mimos dados aos netos, normalmente eles são o amparo afetivo e financeiro de pais e filhos.

Os avós muitas vezes estão ao lado e até mesmo à frente da educação e sustento de seus netos, com sua sabedoria e experiência, e muito contentes por vivenciar os frutos de seu fruto, ou seja, a continuidade da família.

Sendo assim, em virtude da omissão ou impossibilidade dos pais quanto aos deveres em relação à prole, não são poucas às vezes, em que os avôs têm sido instados a prover a omissão no que tange à sobrevivência e educação dos netos.

Quando os pais, por irresponsabilidade ou impossibilidade não suprem as necessidades dos filhos e estes ficam à míngua, seus ascendentes, ou seja, os avós, são chamados a fazê-los desde que convocados judicialmente, se assim entender o Juiz, para que possam economicamente cumprir a obrigação inadimplida por seus filhos.

Nesse sentido, eis que surgem os direitos e as obrigações dos avós, conforme veremos a seguir:

I – Direito à ancestralidade

Sabemos que ao nascer, todo mundo recebe o sobrenome dos pais e dos avós, sinal de identificação de sua ancestralidade. Pelo menos é isso que deve figurar no registro de nascimento.

Porém, na ausência de algum desses dados, surge o direito de conhecer a origem do grupo familiar e dos vínculos de parentesco.

Dessa forma, a busca da ancestralidade é um direito de personalidade, direito esse que dispõe de proteção constitucional, conforme artigo 5º e 226 da Constituição Federal.

Conhecer a sua origem permite saber quem são os pais, os avós e os demais parentes e familiares. Até mesmo na adoção há o direito de conhecer a origem biológica conforme prevê o Estatuto da Criança e Adolescente.

Com a divulgação do Direito de Família, o indivíduo aparece repleto de direitos, o que tem levado a questionamentos doutrinários e jurisprudenciais sobre a possibilidade do filho investigar a sua ancestralidade, ou seja, a paternidade de seu pai.

A pergunta mais frequente é se falecido alguém que nunca buscou identificar sua paternidade, pode o filho dele ingressar com uma ação investigatória contra o suposto avô ou avó?

Será que só o filho pode inquirir seu pai ou o neto também pode fazê-lo?

Tal pretensão encontra óbice na legislação vigente, cito ao artigo 1.606 do Código Civil que assim dispõe: “a ação de prova de filiação compete ao filho, enquanto viver, passando aos herdeiros, se ele morrer menor ou incapaz. ”

Trata-se da chamada ação personalíssima, onde somente no caso de alguém falecer menor ou incapaz é que o direito de propor ação investigatória passaria a seus herdeiros.

Na prática jurídica, diante da letra da lei, os juízes costumam vedar a ação do herdeiro do falecido diretamente contra os avós, buscando identificar a ancestralidade para fins patrimoniais e sucessórios.

O fundamento se encontra na falta de legitimidade dos netos para buscar a identificação da verdade biológica com referência ao genitor já falecido.

Logo, a prerrogativa de ver reconhecida a relação de parentesco constitui direito próprio, personalíssimo, com relação ao nome e à ancestralidade.

Não se cuida de exercício de ação em nome de outrem, ou seja, do neto, em nome do pai, para investigar a paternidade deste perante o seu genitor.

Esclarece-se que a ação investigatória de ancestralidade é proposta pelo neto perante o avô. O neto age em nome próprio, pois se o pai desse neto não quer exercer seu direito, a lei não pode proibir e obstaculizar que ele busque conhecer o avô, sob pena de negar a este neto o exercício do direito de personalidade.

Pode parecer um pouco confuso, mas também não é necessário que o pai tenha falecido para se reconhecer a legitimidade do neto para propor ação contra o seu avô.

O ECA não deixa margem para dúvida, vejamos o disposto no artigo 27:

Art. 27. O reconhecimento do estado de filiação é direito personalíssimo, indisponível e imprescritível, podendo ser exercitado contra os pais ou seus herdeiros, sem qualquer restrição, observado o segredo de Justiça.

Em suma, não tendo o filho buscado o seu direito, o neto pode exercer seu direito personalíssimo ao nome, investigando o avô ou a avó por exemplo.

No entanto, da demanda nem sempre resultam efeitos jurídicos pois a pretensão geralmente é buscar a alteração da identidade para assegurar algum direito patrimonial ou de ordem sucessória.

Ainda, a jurisprudência vem reconhecendo e admitindo o direito à multiparentalidade e via de consequência o registro do nome de mais um pai ou de mais uma mãe, desde que comprovada a afetividade de quem não é o genitor biológico.

Em virtude disso, alguém pode ter mais de dois pais e de quatro avós no registro, dispondo de todos efeitos, inclusive sucessórios.

II – Direito de convivência (visitas)

A Constituição Federal, no artigo 227, preceitua que constitui dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, dentre outros direitos básicos, o direito à “convivência familiar e comunitária”.

 Outrossim, tanto a Constituição quanto o ECA asseguram o direito à convivência familiar[1], porém, não estabelecem limites.

De fato, os vínculos parentais não se esgotam entre pais e filhos e o direito de convivência se estende aos avós e a todos os demais parentes, considerando sempre o melhor interesse das crianças e adolescentes.

O entendimento do Poder Judiciário é no sentido de permitir e criar mecanismos para que os avós visitem os netos, quando proibidos pelos pais, pois este direito que também decorre, antes de tudo, do direito dos menores à convivência familiar.

 Não é só porque os avós residem em outro Estado ou País, ou até mesmo porque possuem divergências com os pais da criança e do adolescente que a convivência não poderá ocorrer.

O Estatuto da Criança e do Adolescente, nos artigos, 16 e 25, faz menção dessa situação do direito de família. A fim de garantir o contato entre crianças e avós, para que mantenham sadios os vínculos de amor e de afeto, pode o juiz obrigar os genitores para que cumpram e se comprometam a estimular esse contato. Muitas tem sido as decisões do judiciário neste sentido.

Não há dúvidas de que a harmonia e paz familiar é a base principal para o desenvolvimento humano e social.

Importante observar que o interesse do menor deve sempre ser levado em conta. É essencial também que as visitas por parte dos avós se condicionem ao bem-estar dos netos, servindo-lhes como efetivo apoio, contribuindo com a educação e o bom desenvolvimento da criança e do adolescente.

Desse modo, nada mais lógico e sensato que, com a separação dos genitores ou qualquer outra situação em que ocorra esse afastamento, como por exemplo a pandemia[2] da covid19, os avós, tanto maternos, quanto paternos, continuem a conviver normalmente com os netos, assegurando seu direito e atendendo as particularidades e interesses de cada caso de forma individualizada.

Até mesmo porque o convívio e a proximidade com os avós, bem como a ligação com sua ancestralidade refletem de forma positiva ao bom e pleno desenvolvimento da personalidade do menor.

III – Direito de Guarda

A guarda dos filhos é uma atribuição dos pais no exercício do poder familiar. Como há situações em que essa convivência não vem em proveito dos filhos, muitas vezes ocorre a suspensão ou perda do poder familiar em relação a ambos os genitores.

Igualmente, quando da separação do casal, constatada a inconveniência dos filhos permanecerem na companhia de qualquer dos genitores, a guarda deve ser atribuída a outrem.

Nesses casos, cabe ao juiz deferir a guarda da criança ou adolescente para algum parente a quem revele compatibilidade com a natureza da demanda, considerando, de preferência, o grau de parentesco e as relações de afinidade e afetividade.

Na hipótese de os pais não estarem aptos ao exercício do poder familiar, os avós são os primeiros convocados.

Como os avós não podem adotar os netos (Artigo 42, § 1º do ECA), destituídos os pais do poder familiar, há que se atentar se a permanência na família biológica não vai gerar maiores prejuízos, analisando, caso melhor atenda ao interesse do neto, que seja ele encaminhado para a adoção.

Quando crianças ou adolescentes estão na guarda de fato dos avós, ressalta-se que é competente para solucionar qualquer tipo de controvérsia a vara de família e não a vara da infância e juventude.

Vemos com muita frequência avós buscando a guarda dos netos somente com a finalidade de assegurar-lhes direitos previdenciários, sob a justificativa de que o neto vive com eles.

Mas, muitas vezes o objetivo verdadeiro é garantir o futuro do neto quando do falecimento dos avós, transferindo o dever de sustento aos cofres públicos, porém, os juízes sempre estão atentos para conferir e averiguar todas essas questões antes de deferir ou não a guarda de um neto aos avós.

Além disso, a legislação também admite o pedido de guarda dos netos pelos avós quando os pais são menores e estão sujeitos ao poder familiar. Nessas hipóteses, é de se deferir a guarda por tempo determinado, ou seja, até os pais adimplirem a maioridade.

Fora isso, não cabe transmitir ao Estado o poder e dever de prover o sustento de alguém que tem pais com a obrigação de guarda e sustento.

Como a guarda compartilhada é prioritária, nada impede que seja estabelecida essa modalidade entre pais e os avós, considerando o melhor interesse.

IV – Direito de Tutela e curatela

De forma expressa o artigo 1.731, I do código Civil traz que são eleitos os ascendentes (avós) como primeiros legitimados para o exercício da tutela, caso os pais não procedam à nomeação de tutor.

Quanto à curatela, instrumento de proteção jurídica da pessoa que, por algum impedimento ou em virtude de determinados tipos de deficiência, esteja impossibilitada de manifestar sua própria vontade de forma livre e consciente, é deferido a parentes próximos o direito de requerê-la.

A principal diferença entre tutela e curatela é a idade. O primeiro é atribuído aos menores de idade até a chegada a maioridade. Já a curatela é conferida aos maiores de 18 anos, normalmente pessoas com deficiência ou idosos. Além disso, também há diferentes motivações para a nomeação do tutor e do curador.

V – Obrigação alimentar

Após tratar sobre alguns direitos, destaca-se também as obrigações dos avós. Dentre elas, obrigação alimentar dos avós[3] é a mais importante e possível devido ao princípio da solidariedade, que prevê um dever mútuo de auxílio familiar.

 Mas, mesmo que os avós tenham melhores condições financeiras que os pais, não significa que tenham que pagar integralmente os alimentos aos seus netos.

O código civil traz de forma expressa que são deveres de ambos os cônjuges o sustento, a guarda e educação dos filhos.

E, em seu artigo 1.694 afirma que podem os parentes, os cônjuges ou companheiros pedir uns aos outros os alimentos que necessitem para viver de modo compatível com a sua condição social, inclusive para atender às necessidades de sua educação.

São devidos os alimentos quando quem os pretende não tem bens suficientes, nem pode prover, pelo seu trabalho, a própria mantença, e aquele que, de quem se reclamam, pode fornecê-los, sem desfalque do necessário ao seu sustento.

Em síntese, a lei deixa claro que a obrigação alimentar, primeiramente, é dos pais e, na ausência de condições destes, transmite-se aos seus descendentes, isto é, aos seus avós, que são os parentes de grau imediato mais próximo.

Ademais, os avós que tem condições econômicas e financeiras, só devem ser chamados para contribuir quando seu filho deixar de atender as obrigações de sustento do neto.

Somente o fato dos avós desfrutarem de boa situação financeira não significa que o encargo alimentar deva ser fixado de forma proporcional aos seus ganhos. O limite é o quanto o neto precisa para atender as suas necessidades, as quais os pais não conseguem suprir.

Tudo isso de forma proporcional, pois os alimentos visam a manutenção do alimentando e não o seu enriquecimento ilícito, pela natureza excepcional, subsidiária e complementar da obrigação dos avós.

Por todo exposto, verifica-se que os direitos e obrigações dos avós em relação aos netos são semelhantes aquelas destinadas aos pais, todavia com algumas peculiaridades, fazendo valer o ditado popular de que “os avós são pais duas vezes”.

Se tratando de algum direito ou obrigação, os juízes devem sempre aplicar a lei com sabedoria, analisar cada caso envolvendo avós e netos, evitando que se cometa algumas injustiças, como retirar daqueles que trabalharam a vida toda e agora esperam um pouco de conforto, o necessário que para que tenha uma velhice digna.

É diante desse contexto que se comemora no dia 26 de julho o dia dos avós, data que o comércio se movimenta, pois, os netos lembram-se dos avós e os presenteiam como forma de agradecimento por sua existência, pela atenção e carinho que oferecem e por serem o esteio da família.

Os avós são a base de uma família, ajudam na criação dos netos e muitas vezes, mantém os filhos até mesmo depois de casados. Por isso, manter os laços afetivos com os mesmos é muito importante. O prazer de suas vidas é ver a família bem, todos em harmonia, com saúde, felizes e integrados.

Portanto, se você tem os seus avós vivos, os tratem com carinho, atenção, visite em suas residências não só nas datas comemorativas, mas sempre que possível, pois estar em contato com os familiares aumentam sua autoestima, traz felicidade, ajudando a se sentirem melhor. Certamente esses são fatores que ajudam a prolongar suas vidas e ficam para sempre gravados na memória e no coração.


Por Talita Verônica

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